DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS AOS CÂNONES DA LITERATURA
Para tomar o nosso tradicional CAFÉ COM LETRAS desta semana conosco, convidamos um ilustríssimo brasileiro – Joel Rufino dos Santos. Falando em semana da consciência negra, resgate dos valores da cultura afro-brasileira, influência africana no Brasil e eventos afins que tivemos em Madri, Barcelona e por todo o mundo, pensamos que Rufino dos Santos fosse a escolha mais apropria para nossa tertúlia literária.
Além de ser uma das referências nacionais sobre cultura africana no Brasil, é além de outras facetas, historiador e profesor universitário. Filho de pernambucanos, Joel nasceu no Rio de Janeiro, em 1941. Desde criança, já se decantava pelas histórias infantis encantando-se com as que a sua avó Maria lhe contava. Crescendo no subúrbio de Cascadura, foi ali que aprendeu a apreciar a leitura de histórias em quadrinhos além das da Bíblia Sagrada que ouvia da voz de sua avozinha (curiosamente, eu também quando criança costumava ouvir histórias por minha avó juntamente com leituras de belos Salmos e Provérbios da Bíblia). Juntamente com os gibis, que lia escondido de sua mãe –que supostamente não aprovava esta modalidade literaria- esse foi o tripé da paixão literária do futuro “fabricante de histórias”. Seu pai também teve um papel decisivo nessa formação, presentando-o com uma porção de livros que Joel guardava em um caixote. Ainda jovem, mudou-se com a família para o bairro da Glória e pouco depois entrou para o curso de “História” da antiga Faculdade de Filosofia da Universidade do Brasil, onde começou a sua carreira de professor, dando aula no cursinho pré-vestibular do grêmio da faculdade.
Convidado pelo historiador Nelson Werneck Sodré passa a ser seu assistente no Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), lá conviveu com grandes pensadores, e foi um dos co-autores da “História Nova do Brasil”, um marco da historiografia brasileira.
Já adulto foi exilado por suas idéias políticas contrárias ao regime ditatorial militar do Brasil de então. Morou algum tempo na Bolívia, sendo detido quando do seu retorno ao Brasil em 1973.
Mais tarde, doutorou-se em “Comunicação e Cultura” pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde também foi professor de Literatura. Como escritor, tem extensa obra publicada: livros infantis, didáticos, paradidáticos e outros. Trabalhou como colaborador nas televisivas minisséries “Abolição” de Walter Avancini, transmitida pela TV Globo (22 a 25 de novembro de 1988) e “República” (de 14 a 17 de novembro de 1989). Além disso, já ganhou diversas vezes o Prêmio Jabuti de Literatura, o mais importante no âmbito da literatura infanto-junvenil do país.
Com o golpe de 1964, Joel, por sua militância política, precisou sair do Brasil, exilando-se na Bolívia e logo depois no Chile. Com o exílio, não só se interrompeu a sua vida acadêmica, como também não participou do nascimento do seu primeiro filho, que se chama Nelson em homenagem ao seu mestre e amigo.
Voltando ao Brasil, viveu semi-clandestino, e foi preso três vezes. Na última vez, cumpriu pena no Presídio do Hipódromo (1972-1974). As muitas cartas que escreveu para Nelson foram, mais tarde, publicadas no livro “Quando eu voltei, tive uma surpresa”, considerado o melhor do ano (2000) para jovens leitores.
Com a aprovação da recente “Lei da Anistia” foi re-integrado ao Ministério da Educação e convidado a lecionar na graduação da Faculdade de Letras e posteriormente na pós-graduação da Escola de Comunicação, UFRJ. Obteve da Universidade os títulos de “Notório Saber e Alta Qualificação em História” e “Doutor em Comunicação e Cultura”. Recebeu também do Ministério da Cultura a comenda da Ordem do Rio Branco, por seu trabalho pela cultura brasileira.
Como escritor, Joel é plural, polifacético, singular. Escreveu inúmeros livros para crianças, jovens e adultos, entre ficcção e não-ficção: ensaios, artigos, participação em coletâneas… Recebeu, como autor de livros para crianças e jovens, vários prêmios, tendo sido finalista do Prêmio “Hans Christin Andersen”, considerado o Nobel da literatura infanto-junvenil.
Joel é casado com Teresa Garbayo dos Santos, autora do livro “Conversando com casais grávidos”. Nelson e Juliana são seus filhos. Eduardo, Raphael, Isabel e Victória, os netos queridos.
Quer saber mais sobre Joel?
Nosso querido Joel, em sua vida profissional, exerceu os seguintes cargos:
-Pesquisador do Instituto de Estudos da Religião (ISER);
-Diretor do Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro;
-Presidente da Fundação Cultural Palmares (MINC);
-Membro do Conselho da Secretaria estadual de Cultura;
-Superintendente de Cultura da Secretaria estadual de Cultura;
-Subsecretário da Secretaria estadual de Justiça e Direitos Humanos;
-Diretor de Comunicação Social do Tribunal de justiça e do Tribunal Reginonal do Trabalho;
-Representante do Brasil no Comitê Científico Internacional da UNESCO para o Programa “Rota dos Escravos “Consultor brasileiro do Programa Escolas Associadas, da UNESCO-
-Membro da comissão de comunicação Institucional do Tribunal de Justiça.
OBRA
Intanto-juvenil
- O caçador de lobisomem, ou, o estranho caso do cussaruim da Vila do Passavento, 1975;
- Marinho, o marinheiro, e outras histórias, 1976;
- Aventuras no país do Pinta-aparece e outras histórias, 1977;
- O curupira e o espantalho, 1978;
- Uma estranha aventura em Talalai, 1978;
- Quatro dias de rebelião, 1980;
- O noivo da cutia, 1980;
- A pirinlampéia e os dois meninos de Tatipurum, 1980;
- O soldado que não era; 1983;
- História de Trancoso, 1983;
- A botija de ouro, 1984;
- Dudu Calunga, 1986;
- Rainha Quiximbi, 1986;
- Ipupiara, o devorador de índios, 1990,
- Uma festa no céu, 1995;
- Gosto de África, 1998;
- Cururu virou pajé, 1999;
- O curumum que virou gigante, 2000;
- O presente de Ossanha, 2000;
- O grande pecado de Lampião e sua terrível peleja para entrar no céu, 2005;
- Vida e norte da onça-gente, 2006;
- O jacaré que comeu a noite, 2007
- Na rota dos tubarões, 2008;
- Robin Hood, 2001.
Não-ficção
- História Nova do Brasil, 1963;
- História Nova do Brasil IV, 1964;
- O descobrimento do Brasil, 1964;
- As invasões holandesas, 1964;
- A expansão territorial, 1964
- Independência de 1822, 1964;
- Da independencia à república, 1964;
- O Renascimento, a Reforma e a Guerra dos Trinta Anos, 1970;
- República: campanha e proclamação, 1970;
- Mataram o presidente (co-autoria) (1976);
- História do Brasil 1979;
- O dia em que o povo ganhou, 1979;
- O que é racismo, 1982;
- Constituições de ontem, constituinte de hoje, 1987;
- Zumbi, 1985;
- Abolição, 1988;
- Afinal, quem fez a República?, 1989;
- História, histórias, 1992;
- Quando eu voltei tive uma surpresa, 2000;
- Paulo e Virgínia: o itinerario e o esotérico no Brasil atual, 2001;
- Épuras do social como podem os intelectuais trabalhar para os pobres, 2004;
- Quem ama literatura não estuda literatura, 2008;
- Assim foi se me parece: livros, polêmicas e algumas histórias, 2008;
- Carolina Maria de Jesus, 2009.
Agora vamos descrever um parte de uma de suas obras da Literatura infantil brasileira mais conhecida: “Marinho, o marinheiro”, em sua versão “áudio-livro”, adaptada por Sônia Robatto, com belíssimas ilustraçãos de Michelle, com canções interpretadas por Gilberto Gil e uma leitura interpretativa de primeira qualidade. Na década de oitenta esteve à venda nas bancas de jornais, com o intuito de, suponho eu, tornar assim a literatura infantil mais acessível a todas as clases sociais. Ao final do áudio-livro aparecem sugestões de brincadeiras e ideias para o teatro com criativas propostas de atividades pós-leitura, pois a história não termina no “The end” senão as boas histórias perduram, tem continuidade, não só fora das páginas literárias senão na imaginação de cada infante, no imaginário coletivo de cada um de nós, não importando a idade que tenhamos…
Com todos vocês, a história de…
MARINHO, O MARINHEIRO
Para acompanhar a narração do livro, clicar no seguinte link:
https://www.youtube.com/watch?v=ZcON8Da9UD8
Narrador – O marinheiro Marinho morava no mar. O marinheiro Marinho trabalhava assim: ele subia no mastro do navio e ficava olhando o mar. Quando via terra, ele gritava para baixo:
Marinho – Ei, gente! Terra lá na frente!
Narrador – O trabalho de Marinho era muito importante. Todo mundo batia palmas quando ele gritava. Porque todo marinherio adora descubrir terras novas. Mas vai daí que um belo dia, Marinho ganhou um passarinho. Era um pintassilgo. Marinho ficou apaixonado pelo passarinho e teve uma idéia:
Marinho – Eu não vou usar mais boné. Vou usar o pintassilgo na cabeça.
Narrador – Dito e feito. Daquele dia em diante, Marinho passou a usar o pintassilgo na cabeça. Quando o comandante do navio descobriu o que estaba acontecendo, ficou muito aborrecido. Mandou chamar Marinho, o marinheiro.
Comandante – Seu Marinho, bom-dia. O senhor não usa mais boné seu Marinho?
Marinho – Não, seu comandante. Eu agora uso passarinho.
Comandante – Isso está errado, seu Marinho. Não quero que o senhor use passarinho na cabeça. Quero que o senhor use boné como todo marinheiro. USE O BONÉ!
Marinho – O senhor me desculpe, seu comandante. Mas só usarei passarinho.
Narrador – O comandante ficou vermelho de raiva.
Comandante – Pois então, o senhor não sai do navio. Fica de castigo. Não desembarca no próximo porto. O senhor só sai se botar o boné como todo marinheiro!
Narrador – Marinho não teve medo da raiva do comandante, não! E continuou com o pintassilgo na cabeça. E o comandante encerrou a conversa. Marinho ficou muito tempo de castigo. O navio parava num porto e só Marinho não podia descer, passear , como ou outros marinheiros. Mas Marinho andava feliz. Com o seu pintassilgo na cabeça, ele ficava olhando de cima do navio, as coisas lindas que a terra tem.
Marinheiro – Ei, Marinho, você não vem?
Marinho – Não posso. Estou de castigo!
Narrador – Mas, o tempo foi passando e os pés de Marinho foram se aborrecendo. Eles queriam andar como os pés da gente gostam de fazer. Um dia, os pés de Marinho estavam por conta da vida! E começaram a conversar. O pé direito disse pro pé easquerdo:
Pé direito – Não vamos mais obedecer a este Marinho! Estou cansado de ficar parado!
Narrador – E o pé esquerdo concordou imediatamente:
Pé esquerdo – É isso aí. A gente não tem nada a ver com ese castigo!
Narrador – Dito e feito. Começaram a fazer estripulias. Marinho quería ir para um lado e os pés iam pra outro. Os pés pareciam malucos. Subiam pelas paredes e até andavam pelos tetos! Marinho não estava entendendo nada:
Marinho – Ei, ei, ei! O que é isso? O que está acontedendo?
Narrador – Mas os pés não paravam! Começaram a subir pelo mastro do navio, dando cambalhota!
Marinho – O que é isso? Vocês ficaram malucos? Façam o favor de me explicar o que está acontecendo?
Narrador – Mas os pés continuaram fazendo das suas, subindo pelas paredes, andando pelos tetos, falando:
Pé esquerdo – Nós queremos andar, seu Marinho! Assim não dá pé!
Pé direito – O senhor não sai mais deste navio? Nós queremos andar! AN-DAR!
Marinho – Parem, por favor! Eu vou dar um jeitinho. Nós vamos fugir deste navio.
Narrador – Marinho subiu no mastro do navio e deu um assovio:
Marinho – FIUUUUUUUUUUUUUUUUUI! –e chegou o seu amigo, o cavalo-marinho. Marinho, pumba. Pulou na garupa dele. E foi cavalgando para terra.
“Cavalo-marinho…
Chega mais para diante
Faz uma mesura
Pra toda essa gente…”
Narrador – Marinho chegou à Bahía, bem no meio de uma festa. O povo estava dançando um Bumba-meu-boi. E Marinho já saiu do mar dançando!
Narrador – O povo olhava espantado pro pintassilgo do Marinho.
1ª Pessoa – Olha que marinheiro mais esquisito!
2ª pessoa – Ele não usa boné, ele usa passarinho!
1ª pessoa – Eu já sei quem é ele! Ele é o rei do mar, camará!
2ª pessoa – Ele veio montado no cavalo-marinho!
1ª pessoa – É o rei do mar, camará!
Narrador – O povo começou a falar que Marinho era o rei do mar. Mas acabou a festa. Marinho ia voltar pro navio. Marinho chegou na praia e assoviou:
Marinho – FIUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUIII!
Narrador – Mas o cavalo marinho do Marinho não apareceu.
Marinho –FIUUUUUUUUUUI! FIUUUUUUUUUUUUI! FIUUUUUUUUUUUUI!
Narrador – Assoviou, assoviou. E o cavalo-marinho nada, nada. Marinho ficou sentado na praia, na areia, muito desanimado. Aí, os pés deram um ideia:
Pé direito – Seu Marinho, faça um gaivota.
Pé esquerdo – O Senhor não sabe?
Marinho – Sei, sim. Claro que sei.
Narrador – Marinho pegou um pedaço de papel e fez uma gaivota! Subiu na gaivota e ZUMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMMM! Começou a voar!
Narrador – Mas vai daí que apareceu outra gaivota. E a gaivota do Marinho voou atrás dela. E foram para num navio pirata.
Quando o chefe dos piratas viu o Marinho chegar, perguntou:
Chefe dos Piratas – Quem é você?
Marinho – Sou o rei do mar, camará!
Chefe dos Piratas – Ah… Você é o rei o mar? Então vai lavar o chão!
Narrador – E deu uma vassoura e um balde pro Marinho. A outra gaivota ficou pousada no mastro do navio.Marinho cansou de lavar o chão. Até que o pintassilgo disse:
Pintassilgo – Espere um poco.
Narrador – E saiu voando com a gaivota. Daí a pouco elas voltaram com uma nuvem de passarinhos. Tinha gaivota. Tinha andorinha, Tinha currupião. Tinha beija-flor. Enfim, todo tipo de passarinho tinha. Os passarinhos pegaram Marinho pela roupa, levaram Marinho pelos ares, por cima do mar!
Narrador – Os passarinhos levaram marinho pro navio dele. Quando o comandante viu chegar aquela passarinhada…
Comandante – O que é isso? O que é isso?
Marinheiro – É o Marinho, comandante. Os passarinhos vêm trazendo o nosso Marinho.
Narrador – O comandante nem quería acreditar. Mas Marinho desceu na proa do navio com muito respeito:
Marinho – Dá licença, Seu Comandante.
Comandante – Pois não seu Marinho. Onde o Senhor estava?
Marinho – Na Bahía, Seu comandante!
Comandante – Sei… na Bahía. E essa passarinhada, seu Marinho?
Narrador – O comandante tomou um susto: cada passarinho estaba pousando na cabeça de um marinheiro!
E veio a gaivota e pousou na cabeça do Comandante!
Comandante – O que é isso? O que é isso, seu Marinho? Tire essa gaivota daqui.
Marinho – Por que, seu comandante? O senhor não gosta de gaivota?
Comandante – De gaivota eu gosto. Mas, marinheiro usa boné, não usa gaivota.
Marinho – Mas, passarinho é muito mais bonito, seu comandante. Experimente, tire o boné.
Narrador – O comandante pensou, pensou, pensou…
Comandante – Quero ver no espelho. Eu só acredito vendo. Eu sempre usei boné.
Narrador – Marinho trouxe um espelho pro comandante. O comandante tirou o boné e deixou a gaivota na cabeça. A gaivota bateu asas, cantou, fez tudo que podia para agradar o comandante. Até que agradou.
Comandante – É mesmo! Gaivota é mais bonito! Boné é muito sem graça! É isso mesmo! Gaivota é mais bonito! Boné é muito sem graça. É isso mesmo. De agora em diante quem quiser pode usar passarinho.
Narrador – Os marinheiros bateram palmas.
Marinheiros – Viva o comandante! Viva! Viva o Marinho! Viva a gaivota! Viva o Marinho.
Narrador – E assim o navio foi navegando de porto em porto, descobrindo terras, mundos, mares, com os marinheiros felizes, cada um com o seu passarinho na cabeça, cantando…
FIM
Três palavrinhas só…
Três pontos importantes destaquei quando recentemente reli o “Marinho, o Marinheiro”: 1- a rebeldia do marinheiro ante a autoridade; 2- o afã por ser diferente, original; e 3- o desejo de libertade. É curiosa a forma como a insubordinação do marinheiro é tratada, de maneira natural como se fosse comum esse tipo de comportamento que, desde o ponto de vista de nossa cultura, pode até ser que seja mesmo.
O Brasil que é esse multicor crisol, a famosa mistura de três outras culturas: a índia americana, a portuguesa europeia, e a africana (de alguns de seus países) não é só isso. O Brasil abrigou dezenas de outras culturas de outros países: a espanhola, a francesa, a holandesa (quando de suas invasões), a masiva imigração italiana quando vieram substituir a mão de obra escrava, recém libertada; no sul do país temos: a alemã, a polonesa, a japonesa, etc., etc., etc… Costumo dizer, que o Brasil, ele sozinho é todo um mundo (não é à toa que temos a representação de um globo terrestre em nossa bandeira)!
Sem divagar muito, comparando a cultura brasileira com outras culturas, observo que em nosso país, assim como em outros países do continente americano também, há muita mais diversidade e liberdade em determinados aspectos se o comparamos com outras nações desenvolvidas, mas até certo ponto (com relação ao famigerado “voto obrigatório” vê-se claramente que NÃO). Caracterizamo-nos mais pela diversidade que pela semelhança pela “unidade”.
A ideia de Marinho de usar passarinho ao invés de boné (“como todo marinheiro”) ademais de original, é quase que um grito de liberdade! Além do mais, o autor escolheu uma “gaivota” como subistituta do boné, a “salvadora da pátria” – o personagem-chave para a resolução da trama: ora, quer melhor símbolo de libertade que um, a AVE??? Uma libertação que pode ser transposta para outros ámbitos: uma libertação de um regime hierárquico, autoritário e repressor, o que há de mal em tomar um dia de folga? Dizem os psicológos que tomar um dia de folga faz até bem para a saúde mental, neste ámbito eu já não opino, por desconhecer por completo.
A rebeldia: Marinho, nega-se obedecer ao comandante que simplesmente lhe deu um “castigo”, castigo este que gerou mais ideias libertárias: fugir do navio sem hora para voltar e quando decide voltar, o intrépito e peculiar marinheiro é recebido sem demais punições e ainda convence o comandante do contrário (trocar o boné por passarinho) e, como se não bastasse, ainda é aplaudido pelos colegas – o que revela sua ânsia de libertação reprimida… Por outro lado, entendemos que do ponto de vista de uma criança, o mundo infantil é um mundo mágico onde tudo pode acontecer, um universo paralero ao mundo real, uma realidade idealizada que se rege por outras regras, digamos que “sociais”. Entendendo o conto desta forma, compreenderemos que a rebeldia do marinheiro Marinho não lhe traz consequências mais graves por ele não viver no mundo real senão em um “mundo encantado” também com agrados e castigos, mas regido por outras normas, cuja relação causa-consequência não é equânime tampouco equipada ao nosso vil mundo real… Deixo estas palabras para a sua reflexão!
Minha recomendação é de que ao ler este conto com as crianças que se discuta a questão dos valores, das consequências de nossos atos e o lado positivo de querer ser diferente, original. Com relação ao afã pela originalidade, por “ser ou parecer diferente” vejo que não há nada de mal, pelo contrário. Creio que não há nada de mal em enxergar que somos diferentes. E querer parecer diferente pode fazer-nos ser ainda até mais concientes de que devemos, ou melhor dizendo, “temos como obrigação” respeitar o outro, seja ele semelhante ou não a nós , fomentando assim um mundo mais solidário, mais multicor, onde cabemos todos, com bons valores como a civilidade, a compreensão, o perdão, o amor pelos animais e em destaque aqui, o respeito pelo outro, outro este tão diferente de mim ou que simplesmente optou por ser diferente… Para isto existe esta palavra tão deliciosa: LIBERDADE!