O Trio Clarioca é o único grupo brasileiro a participar do Clarinetfest 2015, festival dedicado ao clarinete, promovido pela International Clarinet Association, de 22 a 26 de julho, em Madri. Formado por Vitor Macedo, Weslley Guedes e Marcelo Vieira, o Trio Clarioca fará um recital de músicas contemporâneas brasileiras interpretando obras de Mauricio Carrilho e Jayme Vignolli. Além disso, o trio se apresentará com a Roda de Choro de Madri (20), no Centro Cultural Conde Duque (24), e nas cidades de Ávila (27) e Salamanca (29). Mais informações abaixo.

Nesta entrevista, o clarinetista Vitor Macedo conta um pouco da trajetória do grupo, do trabalho desenvolvido para divulgação da música brasileira nas escolas e dos concertos que realizarão na Espanha. Confira!

Como surgiu a ideia de formar o Trio Clarioca?

A ideia de formar um trio nasceu de uma forma muito espontânea a partir de uma sintonia que ia para além da clarineta e o fazer musical. Foi em 2013, na ocasião do Simpósio de Música de Vassouras, um festival no interior do estado do Rio de Janeiro que decidimos por montar o grupo em um bate papo regado à pizza, ideias e sonhos.

Quando voltamos do Festival, montamos o Trio Clarioca e começamos a ensaiar e a tocar o projeto de pesquisa de repertório onde nos deparamos com uma importante literatura para esta formação desde Mozart à música brasileira como compositores como Claudio Santoro e Jayme Ovalle. Isto foi uma grande surpresa, pois este repertório era inédito e inexplorado pelos clarinetistas brasileiros. Esta descoberta nos atentou para a busca de parceria com compositores contemporâneos a fim de aumentar e divulgar e explorar a música brasileira para esta formação.

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Os integrantes do Trio Clarioca: Marcelo Vieira, Weslley Guedes e Vitor Macedo. Foto: Julia Assis

O clarinete, no Brasil, está associado ao choro e o repertório de vocês é bem amplo percorrendo desde a música erudita à popular. Justamente, no final dos anos 90, houve a redescoberta da Lapa, do samba de raiz e do chorinho. Hoje a “geração Lapa” se consolidou e o choro está ganhando o status que ele merece. Como vocês veem este movimento?

Entendo que choro como a primeira música urbana feita no Brasil sempre se manteve viva e em constante processo de renovação e criatividade. Em alguns momentos, porém, devido a um mercado fonográfico que se desenvolve a luz do poder de mercado que segmenta e direciona a sua produção excluindo a possibilidade de uma pluralidade e diversidade. Sem contar a grande massificação de músicas estrangeiras impostas quase que goela a baixo por todos os meios de comunicação.  Colocar o pagode no mesmo saco do samba, por exemplo, é não compreender os fundamentos da música brasileira. Infelizmente este conceito se torna uma informação que segrega as derivações de linguagem do samba que são o partido alto, o samba-canção, o samba de breque e etc., e o samba de raiz, ou seja, o que tem um fundamento vira quase um gênero à parte.

Com a escassez de rodas de choro, a geração de choro da década de 90 pra cá e dos anos 2000 é uma geração diferente. Ao meu sentido, ela não se desenvolveu especificamente a partir do rico ambiente das rodas de choro, mudando um pouco a naturalidade pela qual o choro se desenvolveu a partir da oralidade e da informalidade que as rodas de choro mantinham.

Na Lapa ou bares do Rio de Janeiro são poucos os bares que oferecem serviços espaços com dignidade para o músico tocar salvo algumas exceções. A galera mais nova vem aprendendo nas escolas. Aqui no Rio tem um projeto muito bacana do qual fiz parte chamado “Escola Portátil de Música” que foi celeiro de grandes instrumentistas. Esta Escola aliava o padrão e a formalidade de uma estrutura escolar sem deixar perder o espírito do ensino informal da roda de choro.

Como o trabalho do Trio Clarioca se inscreve neste contexto?

O trabalho do Trio Clarioca tem reflexo dessa cultura da música popular, pois os compositores de nossas músicas vêm deste rico universo e isso tem sido o grande diferencial do grupo que tenta construir uma música que tem essa influencia, mas ao mesmo tempo se desenvolve sobre paradigmas estéticos mais formais. Na verdade é uma junção do escrito e do improvisado. Essa é mais uma particularidade do choro romper com padrões estéticos e se encaixar em todo formação instrumental seja ela a de regional ou a de trio de clarinetas.

Além dos concertos, vocês fazem um trabalho de divulgação da música erudita e popular entre comunidades carentes. Como funcionam estas apresentações?

Este projeto funciona a partir de um estímulo que vai de encontro a uma contra resposta perante a sociedade. Todos nós iniciamos a nossa carreira a partir de projetos que tinham um vinculo social muito grande e só conseguimos nos desenvolver como músicos, pois nas bandas de interior em Cordeiro (RJ) onde comecei, no projeto de música nas escolas em Barra Mansa (RJ) onde Weslley começou, e na igreja em São Gonçalo (RJ) da qual o Marcelo veio este cunho social era muito presente. Desenvolver este trabalho nas escolas e comunidades carentes é um orgulho e uma forma de devolver e compartilhar a sociedade o que recebemos e pesquisamos.

Qual é a resposta das crianças?

A prática da música de câmera é pouco difundida pelos meios de comunicação presentes e apresentar isto nas escolas funciona como uma importante prática na inserção de novas plateias e na promoção da diversidade cultural que acreditamos que mereça estar presente nas escolas e na formação do indivíduo. Tentamos estimular a inteligência emocional e criativa a partir da nossa música promovendo um diálogo mútuo com os alunos e contextualizando ao máximo a nossa música. Além do mais é super prazeroso a respostas das crianças são sempre muito satisfatórias tentamos contextualizar ao máximo as crianças são muito sinceras e suas respostas tem sido bastante positivas é um trabalho que nos dá muito prazer.

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O Trio Clarioca ainda divulga a música de câmara em escolas. Foto: arquivo pessoal.

Falando um pouco do encontro da Espanha. Qual é a expectativa do Trio Clarioca para este evento?

É um sonho de garoto que será realizado. O Clarinetfest2015 promovido pela Associação Internacional de Clarinetes é sem dúvida o mais importante festival de clarineta do mundo.  O Clarinetfest abrange artistas de todo o mundo e poder participar deste festival representando a clarineta brasileira através de importantes compositores contemporâneos brasileiros como Mauricio Carrilho, Jayme Vignolli, Pedro Paes e Jarbas Cavendish é motivo de muito orgulho.

Além do Clarinetfest, o Trio Clarioca vai se apresentar em outro lugar na Espanha?

Vamos tocar na Roda de Choro de Madrid, no dia 20 de julho, através de um convite feito pela grande querida que é a Fabi Ferraz, brasileira que reside em Madrid e desenvolve um belíssimo trabalho em prol do choro e da música brasileira. No dia 26, em Ávila, no Auditorio San Francisco a partir de um convite da Associação Filarmonia que promove música de câmara; e no dia 29, na Universidade de Salamanca, no Centro de Estudos Brasileiros.

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O Trio Clarioca toca em Madri, Ávila e Salamanca.

Imagino que além do Trio Clarioca, os integrantes tenham projetos pessoais. Você poderia me dizer quais?

Cada integrante desenvolve a sua carreira de forma específica e singular tornando o grupo bastante homogêneo no que tange as especificidades e qualidades de cada um.

Vitor Macedo integra importantes grupos instrumentais como a Banda Filarmônica do Rio de Janeiro e a Camerata Brasilis na qual lança este ano lançará o segundo CD intitulado “Suíte Popular” em parceria com cantora Teca Calazans onde traz a tona canções inéditas de compositores consagrados na MPB como Paulo Cezar Pinheiro, Radamés Gnatalli, Mauricio Carrilho, Delcio Carvalho, Luiz Vidal entre outros.

Este ano, Vitor Macedo estreou um trabalho com o quarteto de choro “Novo Cordão” cujo nome faz uma homenagem a um importante grupo de choro do inicio do século passado e que gravou pela casa Edison, no Rio de Janeiro. O “Novo Cordão” mantém a mesma formação do conjunto antigo que é a de cavaquinho, violão, pandeiro e clarineta. O grupo tem como missão o resgate do repertório de choro do século passado resultando em transcrições e novas interpretações dessas obras bem como apresentar composições autorais mantendo viva a tradição do choro. Além disto, cursa bacharelado em clarineta na UFRJ onde além das práticas ligadas a performance e desenvolve pesquisa acadêmica  referentes à história clarineta no Brasil.

 Marcelo Vieira também cursa bacharelado em clarineta na Uni-Rio (Universidade Federal do Estado do RJ). Seus objetivos são completar o bacharelado em clarineta e  seguir com a carreira acadêmica. Marcelo encontrou no projeto do Trio Clarioca um importante estímulo para desenvolver de forma específica o estudo do clarone seguir se aprofundando neste instrumento no mestrado na área de performance.

Weslley Guedes também integra a Banda Filarmônica do Rio de Janeiro e tem uma carreira dedicada à pedagogia musical. É formado em licenciatura pelo Conservatório Brasileiro de Música e desenvolve trabalho de musicalização no Educandário da Igreja da Candelária no RJ. Suas metas são continuar com este trabalho, seguir com a carreira acadêmica e continuar a desenvolver o projeto pedagógico de inclusão social e formação de novas plateias com o Trio Clarioca bem como estender este projeto para além do Rio de Janeiro.

Para finalizar, queria saber quais são os planos para o futuro do Trio Clarioca.

Os planos para o futuro são o expandir o nosso projeto pedagógico e de gravar o nosso primeiro álbum. Esta viagem à Espanha nos proporcionou lindas parcerias e encontros um repertório inédito e muito interessante no qual acreditamos muito que mereça ser compartilhado e registrado, pois contribui para a literatura de música de câmara feita para clarineta no Brasil, ou seja, continuar sonhando, construindo e realizando.


Trio Clarioca em Madri – Roda de Choro de Madri

Onde? Roda de Choro de Madri. Bar Liber Art. Calle Ave María, 32. Metrô Antón Martín, L1 ou Lavapiés, L3.

Quando? 20 de julho, às 21:30.

Quanto? Entrada livre e colaboração voluntária.


 Trio Clarioca em Madri – Clarinetfest2015

Onde? Centro Cultural Conde Duque. Calle del Conde Duque, 9-11. Metrô: Ventura  Rodriguez, L3.

Quando? 24 de julho, às 11:30.


 Trio Clarioca em Ávila – Asociación Filarmonía

Onde? Auditorio San Francisco

Quando? 27 de julho, 19:30. Calle Valladolid, s/n,

Quanto? 4 euros (sócios Filarmonia) e  5 euros (não associados)


Trio Clarioca em Salamanca

Onde? Centro de Estudos Brasileiros. Plaza de San Benito, 1.

Quando? 29 de julho, às 12h.

Gratuito


 Juliana Bezerra escreve neste espaço e no blog Rumo a Madrid.